A D/s é uma das quatro componentes do conceito guarda-chuva denominado BDSM, sendo as outras o Bondage, a Disciplina e o Sadomasoquismo.
A D/s representa a erotização da transferência de poder real. Este poder consiste no direito e, consequentemente, na responsabilidade pela tomada de decisões que afetam, de fato, a vida real.
É próprio dessas decisões estarem vinculadas aos direitos naturais, tais como a vida, a liberdade e a propriedade, bem como aos que deles derivam, como a liberdade de consciência e de expressão, o direito à busca da felicidade e da realização pessoal, e o direito de adquirir ou dispor das propriedades legitimamente obtidas.
Em uma relação legal e saudável, a transferência de tais direitos só pode ocorrer mediante o consentimento livre e informado das partes, sendo que essa transferência pode ser revogada a qualquer momento, embora nunca retroativamente. Este constitui um direito inalienável do indivíduo.
Em tempos nos quais se apregoa uma (falsa) igualdade nas relações, observa-se que as pessoas tendem a ter cada vez menos intimidade com conceitos e estruturas que envolvem a manutenção da transferência de poder.
Tal dificuldade, por sua vez, compromete a preservação do caráter erótico da transferência de poder real. É exatamente por esse motivo que se torna necessária a utilização de metáforas de poder capazes de auxiliar ou favorecer a manutenção do aspecto erótico dessas transferências.
Com esse objetivo, podem ser empregadas quaisquer estruturas de poder, reais ou imaginárias, que colaborem para a manutenção de uma D/s a longo prazo.
Para tornar mais clara essa concepção, apresentam-se a seguir alguns exemplos de metáforas de poder:
Exemplos baseados na realidade:
- A estrutura militar, por meio da utilização de patentes, tarefas e punições típicas do contexto militar.
- A monarquia absolutista ou o período medieval, utilizando títulos de nobreza das cortes europeias e mimetizando alguns de seus hábitos.
- Relações parentais, como as entre pais e filhas, tios e sobrinhas, entre outras.
- Relações profissionais, como as entre chefe e secretária.
- Relações acadêmicas, como as entre professor e aluna.
Também podem ser utilizadas metáforas baseadas na ficção ou nas mitologias, tais como:
- A cultura Goreana.
- A cultura amazona.
Três reflexões merecem destaque.
A primeira diz respeito à possibilidade de construir uma D/s sem a utilização de metáforas de poder.
Embora a resposta a essa questão tenha natureza subjetiva, pode-se afirmar que, ainda que seja possível, manter a hierarquia sem recorrer, de forma explícita ou implícita, a alguma metáfora de poder revela-se consideravelmente mais difícil.
Tal dificuldade decorre do fato de que a convivência tende a gerar um efeito psicológico de nivelamento entre os conviventes. Nesse contexto, a metáfora de poder constitui uma ferramenta relevante para sustentar a percepção da hierarquia.
A segunda reflexão trata da diferença entre o uso da metáfora de poder na D/s e o emprego da metáfora de poder estereotipada que caracteriza os jogos de Disciplina.
Duas distinções principais podem ser observadas nesse caso.
A primeira refere-se à duração dos papéis associados à metáfora. Nos jogos de Disciplina, os papéis costumam ser assumidos por períodos curtos, enquanto nas metáforas de poder aplicadas à D/s, os modelos são escolhidos de modo a permitir seu uso contínuo.
A segunda distinção relaciona-se à intensidade: nas transferências de poder estereotipadas, os papéis tendem a ser mais intensos, uma vez que não se destinam a serem vividos perpetuamente, mas apenas durante intervalos curtos. Essa característica possibilita experiências emocionalmente mais intensas, porém de menor duração. Associado a isso, destaca-se o aspecto teatral: nas transferências estereotipadas, a ênfase na intensidade manifesta-se em comportamentos mais exagerados e performáticos. Em contrapartida, nas metáforas de poder empregadas na D/s, os comportamentos costumam ser suavizados, de modo a viabilizar sua vivência prolongada.
A terceira reflexão diz respeito à possibilidade de que já se utilize alguma metáfora de poder em uma D/s, ainda que de forma inconsciente. A resposta a essa questão é afirmativa.
O uso de pronomes de tratamento, como “Lord” ou “Master” ou qualquer outro termo que remeta a uma posição hierárquica em determinado contexto, configura um exemplo claro de apoio em uma metáfora de poder. Da mesma forma, ao estruturar a D/s inspirando-se em modelos de poder — reais ou imaginários — para estabelecer a hierarquia ou determinados comportamentos na relação, também se está recorrendo a uma metáfora de poder.
A consciência acerca desse conceito pode contribuir significativamente para o aprofundamento da compreensão sobre o formato de D/s que se almeja viver.
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